domingo, 16 de fevereiro de 2014

ARTIGO ESPECIAL: Ainda e sempre a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC

Um dos temas que vem gerando as maiores polêmicas é quanto à multa prevista no art. 475-J, que dispõe: “Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”.
Mesmo com o passar dos anos, ainda permanecem diversas dúvidas a respeito dessa multa, que poderiam ser enumeradas da seguinte forma: a) qual a natureza dessa multa; b) é possível isentar o devedor do pagamento dessa multa?; c) é possível executar provisoriamente essa multa?; d) a intimação para pagamento da dívida sob pena dessa multa deve ser feita na pessoa do advogado, na pessoa do próprio devedor ou esta intimação é até mesmo dispensável?; e) se houver necessidade de intimação, em que momento esta deve ser efetuada?; f) essa multa pode ser utilizada em outros procedimentos executivos, como aquele previsto na Lei no 9.099/95?
Quanto ao questionamento “a”, que cuida da natureza dessa multa, é correto afiançar que se trata de um meio de coerção, imposto por lei, para que o executado se sinta estimulado a cumprir o que consta no ato decisório. Tem, portanto, natureza processual e guarda enormes semelhanças com as astreintes, embora tenha as suas próprias particularidades, como a circunstância de ter o seu montante estabelecido por lei.
Com a sua criação, o legislador sinaliza pretender encerrar antiga controvérsia, ao possibilitar que seja fixado um meio de coerção que estabelece uma obrigação pecuniária mesmo quando se está diante de outra obrigação de pagar impaga. A jurisprudência, tradicionalmente, repudiava essa possibilidade, sob a justificativa de que já existiria um meio de sub-rogação mais eficaz (penhora).
Quanto ao questionamento “b”, se o devedor pode ser isentado de pagar a multa, é correto concluir que sim, pois, sendo esta multa um meio de coerção, ela somente se justifica caso o executado realmente tenha condições para cumprir a obrigação reconhecida na decisão. Neste raciocínio, não parece razoável utilizá-la em toda e qualquer situação, em especial se o executado demonstrar, por exemplo, que realmente não possui qualquer bem passível de penhora. Assim, nesta hipótese, o juiz poderia isentá-lo do pagamento dessa multa, já que a mesma não está ali para punir e sim para, como visto acima, reforçar o cumprimento de uma prestação.
Quanto ao questionamento “c”, que cuida da possibilidade de execução provisória dessa multa, percebe-se aqui a mesma dúvida que permeia a execução das astreintes e que será melhor enfrentada em momento próprio (v. item nº 37.1.3). No entanto, parece correto concluir que, se o título judicial encontra-se sendo impugnado por recurso despido de efeito suspensivo, essa circunstância por si só já autorizaria a exigência imediata não só da obrigação devida mas, também, da referida multa. Este não é, porém, o entendimento dominante a respeito, já existindo diversos julgados do STJ que exigem o trânsito em julgado da referida decisão para que a multa possa realmente incidir.
Quanto às dúvidas do item “d”, que tratam da necessidade, ou não, de intimação da parte ou do advogado para que haja o termo inicial da fluência dos quinze dias mencionados no art. 475-J, há ainda bastante controvérsia a respeito. Com efeito, quando foi publicado o texto normativo, rapidamente alguns doutrinadores se posicionaram quanto à necessidade de intimação pessoal do devedor, uma vez que o advogado somente possui poderes processuais, não sendo razoável que uma decisão judicial possa afetar o patrimônio de uma determinada pessoa sem que a própria seja devidamente cientificada a respeito. Mas, por outro lado, diversos outros estudiosos sustentavam que a intimação pessoal do executado traria enorme dispêndio de tempo, motivo pela qual a mera ciência do advogado já possibilitaria o inicio da fluência do referido prazo.
O STJ, em sua pioneira decisão sobre o tema, adotou entendimento distinto dos dois acima, no sentido de que essa intimação sequer seria necessária, devendo a contagem do prazo de quinze dias se iniciar no mesmo momento em que a decisão jurisdicional transitar em julgado. No mesmo julgado também constou, por sinal, que não era possível a exigência dessa multa em sede de execução provisória, posto que a mesma somente seria devida após o trânsito em julgado da sentença. No entanto, mesmo já passados alguns anos, ainda assim essa dúvida persiste, eis que o mesmo Tribunal, em decisões mais recentes (embora não tão frequentes), já sinalizou em sentido oposto, ou seja, pela necessidade de se intimar ao menos o advogado da parte para que o referido prazo tenha a sua fluência iniciada.
Se for adotada a premissa de que há necessidade de se intimar o advogado da parte para que haja a fluência do prazo de quinze dias, surge então o questionamento “e”, que justamente é pontuar em que momento essa intimação deve ser realizada, uma vez que a interpretação literal do art. 475-J (e seguintes) é completamente omissa a respeito. Percebe-se, em conclusão, que o STJ não possui até o presente momento uma posição uniforme sobre este tema, o que vem fomentando algumas intranquilidades e inseguranças jurídicas.
De acordo com uma interpretação literal dos dispositivos do CPC, o rito para o cumprimento de sentença que condena o demandado a pagar certa soma em dinheiro seria: Requerimento do credor para início da etapa executiva  Determinação da expedição do mandado de penhora e avaliação  Realização da penhora e da avaliação  Intimação do advogado do executado a respeito da penhora e da avaliação e início do prazo para a apresentação da defesa denominada “impugnação”  Apresentação da impugnação, seu processamento e julgamento  Fim da execução ou início da etapa expropriatória visando à satisfação do crédito do exequente.
No entanto, para que seja possível incluir mais uma intimação na pessoa do advogado do executado, este procedimento teria que ser adaptado e passaria a se desenvolver da seguinte maneira: Requerimento do credor para início da etapa executiva  Deferimento e intimação do devedor, na pessoa do advogado, para pagar a dívida em quinze dias, sob pena da incidência da multa de 10% prevista no art. 475-J  Determinação da expedição do mandado de penhora e avaliação findos os quinze dias, já acrescido com a multa de 10%  Realização da penhora e da avaliação  Nova intimação do advogado do executado a respeito da penhora e da avaliação, para início do prazo para a apresentação da defesa denominada “impugnação”  Apresentação da impugnação, seu processamento e julgamento  Fim da execução ou início da etapa expropriatória visando à satisfação do crédito do exequente.
Por fim, quanto ao último questionamento (“f”), que cuida da possibilidade de utilização da mencionada multa em procedimentos especiais, não se vislumbram óbices para o seu emprego, por exemplo, nas execuções entre particulares que tramitam perante o Juizado Especial Estadual. Mas em outros procedimentos, como aquele em que se executa a Fazenda Pública, tal multa já não se afigura possível pois o pagamento não é possível de ser feito em apenas quinze dias, diante da dinâmica própria que é inerente ao processamento dos precatórios ou das requisições de pequeno valor (RPV).



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